segunda-feira, maio 28, 2007

VQP - Plano fechado

A capa da Veja São Paulo, escalada para bater na USP traz uma ridícula foto de uma fogueira em plano fechado. O plano fechado da foto é proporcional a dignidade do papel que se prestam os que assinam a matéria: Alvaro Leme, Maria Paola de Salvo e Sandra Soares, a profundidade do texto, que compra completamente as teses do governo do estado (inclusive em chamar de "suposto' ataque à autonomia, defender Pinotti e querer ver pelas costas a reitora da USP), e é coalhado de expressões como "baderna", "bagunceiros" etc...
O verdadeiro "guia espiritual", para dizer o mínimo, da matéria, é Reinaldo Azevedo. Coitado, está tentando monitorar e patrulhar todos os textos que saem na grande imprensa sobre a greve. Artigos, entrevistas, reportagens, tudo, tudo que sai sobre o assunto na Folha e no Estado merece o elogio ou crítica de Reinaldo Azevedo, basicamente elogiando se concorda com sua opinião, e criticando e desqualificando, inclusive reportagens e relatos feitos no local, se vão contra sua opinião. É um censor nato. Deve estar partindo seu coração as posições ambíguas da cobertura da Folha de S. Paulo. Este fim-de-semana entrou em crise de nervos no seu blog, postou pitis, nervoso ao ver que Serra está em uma sinuca de bico. Apelou para o coração do seu ataque. Postou que a USP é "cara". Consome recursos públicos demais, muito mais que o ensino básico e fundamental (quando não são a mesma coisa). A USP não é cara em comparação a universidades internacionais (como seria, se seus professores ganham muito menos?). A USP é barata para o papel que cumpre em São Paulo e no Brasil, que sem suas universidades e a Fapesp ainda estaria vivendo do ciclo do café (porque nem etanol teria).
É parte do patrimônio político de Serra ter sido presidente da UNE. É parte do seu "apelo", parecer ter laços com a esquerda. Por mais que seja uma farsa difícil de engolir, ele não quer jogar isso no vinagre. A obsessão política de Serra em ser presidente em 2010 cobra seu preço todo o dia. Ele quer tanto que eu acho quase impossível que consiga.
Divertidíssimo, ainda mais vindo de quem vem, o artigo de Fernando de Barros e Silva na Folha de S. Paulo. Deve ter partido o coração do Azevedo. No sábado, foi o editor de economia do jornal a bater o governo. Na segunda, o de política praticamente rifa Pinotti e diz que os estudantes estão "certos" em espalhar fotos de Serra armado pelo campus. Os estudantes de fato foram brilhantes ao levar a crise para o colo do governador.
O plano fechado da capa da Veja reveja quão estreito é o campo de visão do radicalismo da revista, e quão isolada ela está. Levá-la a sério, Veja Q Porcaria, pra que?
Difícil, na ocupação, é saber o ponto certo entre negociar uma saída obtendo o que se quer, a revogação dos decretos. Já que isso é um baião de dois com o governo. Administrar vitórias em política, é em geral mais difícil que não apanhar da tropa de choque...

domingo, maio 27, 2007

Artigo interessante sobre a USP

Eu não concordo com tudo que Vinicius Torres Freire escreveu no artigo que coloco abaixo e que saiu hoje na Folha de S. Paulo. Mas eu acho que é um avanço tremendo na polaridade da discussão sobre a USP, tendo este mérito tremendo de ir contra clichês como "a USP é cara", o do setor privatista que não faz nada pela pesquisa e quer dar o tiro no pé de destruir a universidade pública. Aponta características essencias da USP, como a positiva de atrair bons alunos, e a hipocrisia das fundações e toca na única forma de contrapartida financeira que eu acho que deve ser avaliada, que não acho tabu. Uma taxação extra na renda de ex-formandos, claro, cobrada a partir de certo piso e progressiva ao longo de um período de tempo. O debate em torno da universidade por conta da ocupação é "medíocrel" particularmente por conta da mentalidade instalada no governo Serra (e na mídia, e nas grandes empresas e bancos etc...), governo que ainda coloca um sujeito como o Pinotti para "enquadrar" as públicas em nome da privada, e que tenta regredir a universidade, sem nem reconhecer que está fazendo isso. É natural que em um clima de desconfiança e conflito desses, a prioridade de qualquer debate seja se colocar em oposição as sanhas privatistas e destruidoras do pensamento, não só na universidade, mas também na Fapesp, Fatecs e no Instituto de Pequisa Tecnológica. Qualquer pessoa que conhece a história das universidades e das pesquisas científicas no Brasil sabe o quanto elas tiveram que remar, e ainda remam, contra a corrente para se estabelecer.

VINICIUS TORRES FREIRE

A USP é quase linda, mas é feia

Universidade se torna mais produtiva e custa menos que escolas privadas boas, mas é lerda e não presta contas

A USP PERDE alguns professores para escolas privadas que pagam bem. Não se trata de vaga nem de voga, mas o caso deixou de ser raro. A maioria não deixa a universidade devido à infra-estrutura de pesquisa, ao prestígio ou pelo ambiente intelectual. Ou a tudo isso e mais os complementos de renda oferecidos pelo trabalho em fundações ou por encomendas privadas.
A USP ainda não perde a maioria dos melhores estudantes de São Paulo, mas os divide com a Unicamp e enfrenta a concorrência de boas escolas especializadas de economia, matemática, engenharia. Quantos estudantes ainda prefeririam a USP se seus cursos fossem pagos?
Pesquisa, ambiente intelectual e a maioria dos melhores estudantes ainda fazem a USP. E por quais outros critérios a universidade deveria ser julgada? Pelo seu futuro, talvez; pela produtividade, decerto, embora a medida da eficiência universitária seja um problema (que nem por isso deve ser tratado com a nonchalance do faz-de-conta que suscitam os relatórios burocráticos de produção).
Ao menos desde os anos 90, a USP torna-se mais produtiva. Há mais estudantes por professor, embora uspianos questionem a qualidade da formação de classes de uma centena de alunos. O número de publicações científicas, as de padrão internacional, por docente é 51% maior que em 2000; há mais doutores a dar aulas.
A USP é cara? Faça-se uma conta tonta, dividir o orçamento pelo total de alunos de graduação e pós: dá uns R$ 2.300 mensais por cabeça. Boas escolas privadas de economia e direito de São Paulo, sob supergerentes ou "gente do mercado", cobram uns R$ 2.000 mensais. Mas tais escolas nem de longe bancam a massa de laboratórios, pesquisas, museus, hospitais e serviços da USP. Ou seu grave gasto com aposentados, que levou 19% da despesa total de 2006.
Comparação global? Harvard gasta R$ 26 mil mensais por aluno. Mas quem quer brincar de numeralha terá de fazer algo mais sofisticado que continhas de privatistas raivosos ignaros. Por falar nisso, cabe porém discutir se os uspianos formados deveriam contribuir, na medida de sua renda, para a universidade (sim, pagar o curso ex post). Isso é solidariedade social e intergeracional, não "mercantilização do ensino".
Mas a USP é lerda. Sua burocracia e seu sistema de decisão são ineptos em inovação institucional. A USP não oferece novos formatos de cursos num mundo cambiante. Pouco reage a cursos decadentes ou que jamais se firmaram. É lerda em criar patentes, embora não deva se tornar um balcão de soluções para empresas e programas sociais, como pregam mercadistas ou esquerdóides.
A USP porém não publica periodicamente uma carta de objetivos e compromissos que possam ser verificados pelo público. Não demonstra a qualidade de seus formados. Não presta contas, afora a contabilidade comezinha. Tende a soçobrar sob o peso dos aposentados, sobre o que se finge de morta. Reage a cobranças com passividade ou por meio da militância corporativista e retrógrada.
O debate suscitado pelos decretos Serra é medíocre. É pífia a crítica à USP de um setor privado que mal investe em ciência. Governos ora nada têm a dizer à universidade. Sim, tanto zunzum e tudo ficará na mesma.