SÃO PAULO MALUF
Na segunda-feira, dia 5 de julho, o candidato do Partido Progressista à prefeitura de São Paulo, o ex-prefeito Paulo Maluf, protagonizou uma pequena jam jazzística com um grupo de jornalistas. Vários deles tentaram ditar o ritmo da música, batendo no bumbo de suas várias acusações de corrupção, mas o solista estava impossível. Uma de suas melhores frases: “Eu nunca menti na minha vida pública.”. Outra “eu que sempre fui um homem democrático...”. Ele estava hilário e tinha respostas para tudo, que falava sem hesitar, por mais que soassem absurdas.
Os jornalistas que o entrevistaram eram experientes, preparados e tentaram de tudo. Relembrar que Maluf foi contra as diretas, o minhocão, a águas espraiadas, Paulipetro, dinheiro na Suíça, isolado politicamente etc...
Maluf é o Freddie Krueger da política paulista. Sempre ressurge quando se acha que ele já está acabado. E os 20% de eleitores fiéis que ele carrega com ele, crê-se que poderão mudar de idéia com denúncias de corrupção. E não dá certo. E os jornalistas são crentes que o encurralarão. Mas não conseguem.
Falta tentar entendê-lo e quem vota nele pelo ponto de vista de visão do mundo que estas pessoas tem. Entender o que há de ideologia que resiste e ignora as denúncias, que independe delas. A questão de porque Maluf ainda tem 20% dos votos não tem nada a ver com corrupção, mas com um fato mais duro e difícil de encarar.
Maluf representa uma mentalidade autoritária, do fazer obras, do capitalismo do automóvel desenfreado, da visão privada e egoísta da propriedade, e violenta entre as classes sociais. Maluf pratica uma visão de relação estado-sociedade, marcada pelo fisiologismo, que apesar de absurda e anti-democrática, ainda é tão corrente que o próprio PT se apropriou desta lógica até nas suas relações internas, e o PSDB também. E uma visão de cidade onde o “progresso”, está relacionado a um desenvolvimento industrial e a uma especulação imobiliária predatória. Idéias que estão na identidade de São Paulo, uma das cidades que mais cresceu no mundo no século XX e que seus 450 anos sem grandes reflexões só reforçaram. O elogio ao gigantismo, ao “não pode parar”, ao lucro desenfreado e ao luxo inconseqüente do qual a região da Faria Lima/Berrini é o exemplo máximo para detratores e defensores do modelo.*
É bobagem pensar em Maluf como um exotismo. Ele tem fortes laços com setores da economia (imobiliário, empreiteiras), categorias (policiais, comerciantes, taxistas) e mais que isso, com o imaginário da cidade cruel hiper-capitalista e exploradora sem dó de imigrantes e migrantes. Apaixonada por soluções falsas e publicitárias para problemas complexos, como o Cingapura. Cheia de radialistas dispostos a falar leviandades no ar, ou mesmo alugar este espaço. Com classe média e alta alienadas da situação dos serviços de saúde e educação, só se interessando por buracos, não pagar multas de radares e tirar seu naco do Estado. Com pouco espaços e pouca convivência pública.
Maluf, com sua cara-de-pau infinita e esperteza nas repostas, entra nessa campanha como franco-atirador, um radical livre da sua própria causa pessoal e conservadora. E quem jogará a primeira pedra? O publicitário de Marta Suplicy era o seu, o dele trabalhava na prefeitura até setembro e o vice de Serra era malufista de carteirinha. Serra e os tucanos querem se vender como “competente”, mote de Maluf, e Duda Mendonça, segundo a Folha de S. Paulo, quer vender Marta como “fazedora de obras bem-feitas”, uma das coisas menos importantes no seu governo. A identidade conservadora de São Paulo “não pode parar”, crêem os marqueteiros, que antes de tudo, são especialistas em vender-se, mais do que em vender alguma coisa.
Um exemplo do problema Maluf é sua resposta sobre os CEUs. Marta irá defender o projeto do seu governo. Serra irá atacá-lo dentro da estratégia do PSDB. PT X PSDB, a monótona briga em um tom da atual política nacional. Maluf que não é burro e não tem compromisso com a menor forma de coerência disse que “vai analisar” e que se for ruim, caro demais, não fará. Se for bom, promete que fará não vinte, mas 60 CEUs espalhados pela periferia. Respondendo assim passa a imagem de sensato e responsável, agradando a classes média e alta que odeiam os CEUs, e também a população das periferias onde tem CEU e onde não tem mas se sonha com eles.
Que a arrogante e hiper-confiante direção paulista do PT, que soltou o monstro na arena, achando que era ótimo para ela, embale a criança. No mundo feio da política, sabe-se que o PT no planalto tinha meios de barrar a candidatura de Maluf pelo PP. Mas que preferiu e torceu para que saísse candidato, por calcular que pode tirar Serra do segundo turno, onde então Maluf perderia para Marta Suplicy. A ver, já que há o risco de Marta ter que suar para ir para o segundo turno, com o cenário de Erundina roubando seus votos à esquerda, e Maluf e Serra adiante dela. O PT com o discurso Duda e atitude atual, que prefere usar o oportunismo do que correr o risco de enfrentar e mudar uma concepção de cidade, que enfrente o teste da sua estratégia. No caso, o risco é todo dos moradores de São Paulo.
*Sobre a história da região Berrini/Faria Lima, como o poder público gastou ali uma fortuna, como as comunidades que lá viviam em favelas tiveram suas vidas destruídas, como lucros enormes foram feitos e como a especulação imobiliária construiu um “progresso urbano” sem pé nem cabeça, a editora em que trabalho, a Boitempo, tem um belíssimo livro escrito pela arquiteta Mariana Fix chamado “Parceiros da Exclusão”. Recomendo.
domingo, julho 11, 2004
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