sexta-feira, outubro 01, 2004

AAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHH ELEIÇÕES AAAAA NÃO !!!!!!

Para quem não gosta de eleições, ou não mora em Sampa, os papelotes desta semana vão ser muito chatos (ou interessantes). Prometo que está acabando e daqui a pouco largo disso e volto com mais crônicas, humor, dicas de cinema (preciso ir nele para tanto) e música. Por enquanto, minutinho de sua atenção.

Jornalistas não deveriam declarar seu voto. Muito menos três vezes. Será? Ou será que isso é uma versão tapuia, no fundo anti-democrática, do que seria democracia e isenção. Minha democracia ideal não é (auto) repressão ou um calar de vozes. É a multiplicidade de vozes sinceras nas suas diferentes opiniões. Se Trip, Tutty Vasquez,e outros declaram voto, e se a Folha pratica mas não declara o seu, porque não eu posso falar o meu também, no Íbis do jornalismo, o menor veículo de imprensa não prensado do mundo?

Hoje termino a série e certamente esgoto sua paciência. Juro que não fiquei tão chato assim.


ELEIÇÕES 2004 – SAMPA

A parte 4 vêm depois da cinco, e as duas fecham esta série do papleotes. A inversão dos fatores altera o produto, devido ao fato da parte 4 entrar na esotérica discussão do voto nulo na eleição paulistana, que para a maioria dos leitores dos papelotes deve ter o valor do debate do ponto de fervura da rapadura.

PARTE 5 - PEQUENO GUIA TÁTICO PARA VOTAR EM VEREADOR


Muitas pessoas desprezam ou votam de forma descuidada para vereador. Este pequeno guia tenta ajudar a pesarem melhor este voto, que de quem trabalhou lá dentro, tem muita conseqüência, tanta quanto do majoritário. Vou explicar colocando-me como exemplo.


Passo 1 – linhas gerais do voto ou a opção política

Quais são os valores do seu voto? Esquerda e direita, dizem , significam pouco, mas é mais ou menos por aí. Você é a favor ou contra o atual governo? Quem é seu candidato á prefeito? Um voto para alguém que já o apóia pode significar menos fisiologismo. Quais são as áreas prioritárias que devem ser abordadas por um vereador?

No meu caso, apoio o governo com ressalvas, e meus valores são mais próximos do que, para não chamar de esquerda do PT, vamos chamar de “PT old school”, em homenagem ao hip-hop. Dentro da bancada atual do PT, existe uma divisão entre os governistas e a chamada “bancadinha”, formada pelos vereadores de postura mais independente, crítica e “corretiva”, em relação ao executivo. Existe gente que argumenta que isso adianta pouco, que eles no fundo reforçam uma ilusão de um PT que hoje é “centro –direita”, mas eu acho que de fato eles conseguem melhorar o rumo do governo.

Este é o campo do meu voto. PT independente. Não voto na legenda (não recomendo isso), mas o voto para reforçar diferenças de conteúdo dentro do partido e premiar boas atuações. O seu poderia ser “oposição”, ou “vereadores ligados ao Serra”. O campo limita meu voto a alguns nomes válidos e dá sentido à escolha.

Passo 2 –temas e práticas

Dentro do campo político há uma série de temas que acho importante: participação popular (os conselhos e orçamento participativo), planejamento, proteção do patrimônio público, democratização da comunicação, meio ambiente (transporte público acima do carro), apoio e relação com os movimentos sociais, além dos óbvios: saúde, educação. E claro, ser ético. É muito difícil o mesmo vereador abordar de forma aprofundada todos eles. Por isso mesmo, embora o voto meu seja só um, várias candidaturas são votos válidos.

As práticas são como ele atua. A forma do conteúdo. Mandatos que não praticam o clientelismo, atendendo as pessoas de uma maneira séria e não baseada na troca de favores, que promovem o debate, que informam suas atividades, que tem uma equipe técnica bem preparada no gabinete, e que não dizem só “amén”, ou “vade retro”, ao executivo.

Em resumo, são práticas que permitam que você acompanhe e cobre do mandato após a eleição.

Como a vida é cheia de surpresas, preferi dar preferência a nomes que já têm um trabalho estruturado e testado (o que, de resto, não impede surpresas). Reduzi então para votar em candidatos da atual legislatura. “Renovação” é um mantra usado por muitos picaretas. Prefiro reforçar e mostrar que práticas sérias de mandato podem ser bem-sucedidas.

Dentro de uma cidade imensa como São Paulo, os candidatos também se dividem um pouco por “regiões”, lógica importante principalmente na periferia. Eu acredito que com práticas sérias de mandato é possível superar esta questão que para o bem e para o mal, está relacionada com clientelismo e loteamento de cargos em subprefeituras. Mas é um critério para quem quiser que seja, e não necessariamente negativo se acompanhado dos de cima.

É irônico dizer que os critérios acima me deixaram com candidatos de origem e mais relacionados com a classe média, embora com sinceras e grandes relações com os movimentos sociais. Algo para se pensar.

Passo 3 – sua experiência

Na liderança de governo, onde trabalhei, tínhamos um “álbum de figurinhas”, com foto, nome e telefones de cada vereador. Vi o debate e negociações em torno de projetos importantes para a cidade e ouvi pessoas envolvidas em várias áreas do governo e a seriedade de políticos em diversas situações. Meu voto inevitavelmente nasce daí também.

Passo 4 -Intermezzo

Uma passagem desnecessária (pule se tiver juízo). Tenho dois conhecidos de longa data que se candidataram nesta eleição. Um é meu colega de turma da USP, Eduardo Kui, candidato pelo PSDB. Lendo seu site, eu que comecei a trabalhar aos 22, ele com quase metade disso, que não sou casado nem financeiramente bem sucedido, me senti um fracassado no sonho e valores da classe média. Desejo um feliz nascimento para seu primeiro filho. Mas lendo sua proposta tosca, fascista, sobre favelas, me senti assustado com o desconhecimento do tema pelo meu simpático colega de turma que propõe a sua “erradicação” em nome de predinhos Cingapuras, proposta irreal e anti-democrática. Existem sobrados na favela, um comércio próprio e empregos, que seriam arrasados por tal medida. O Cingapura como solução para favelas só satisfaz os preconceitos e a ignorância da classe média que as vê da avenida.

A outra pessoa é a Soninha, pelo PT. Pessoalmente vou votar em um outro candidato, pelos motivos dispostos acima e abaixo, mas a Soninha é uma pessoa que admiro, conheço faz tempo e confio na sua seriedade. Não precisa da política e está com boa vontade entrando nessa. Defende temas novos e alguns até tabus para a esquerda. Quer construir um mandato participativo e diferente. E está consciente donde esta se metendo. É uma experiência boa, para quem quiser votar nela.

Os dois tem algo que parece ser pré-requisito para ser vereador. Todos os vereadores que eu conheci são um pouco (alguns muito) malucos, no bom ou no mal sentido da palavra. Hiper-ativos, insones etc...

Passo 5 – nomes

Vou votar no vereador Nabil Bonduki - 13633. Mais informações sobre ele no seu site: www.nabilbonduki.com.br. Mais do que apenas votar nele, voto na sua equipe, na prática de mandato, que tanto na análise, como na proposição de projetos e alterações em projetos, e práticas de participação e comunicação do mandato, construíram um trabalho excelente que merece ter continuidade.

Se pudesse votar em dois, votaria também em Carlos Neder - 13666. www.carlosneder.org.br . Um político de uma tremenda seriedade e honestidade, ligado à área de saúde, faz uma campanha com poucos recursos e nítida má vontade da direção do PT contra ele. Era o vereador de que se ouvia de jornalistas “ se é do Neder, não tem truque, é coisa séria, pode ficar tranqüilo”. Foi considerado por ONGs o melhor vereador da atual legislatura.

Se pudesse votar em três votaria ainda na Soninha - 13108. www.soninha.com.br Temas novos como drogas, cultura jovem, reciclagem e um mandato que certamente atrairá pessoas para as questões políticas e participação.

Existem outras candidaturas sérias. Carlos Gianazzi, também do PT, defende a educação com unhas e dentes e é bem rebelde, por assim dizer. Odilon Guedes, da região do Jabaquara, é bastante ligado a questões de orçamento e participação. Tem gente que defende o voto em Paulo Teixeira, por conta de questões de “disputa interna” do PT, como contra peso ao poder de Rui Falcão e da família Tatto. Acho discutível, a diferença e a disputa, mas respeito.

Ao indicar apenas candidatos do PT, não quero dizer que são os únicos sérios. É apenas o meu campo. Dentro de outras visões ideológicas, existem políticos sérios (o termo em si já é um tanto relativo) em outros partidos.


PARTE 4 – PARA ALÉM DO VOTO E DESTA ELEIÇÃO (PÓS PT)

Ia escrever só a parte 5. Mas a iniciativa de um grupo de intelectuais (a palavra me incomoda e trabalho tanto com ela), de São Paulo de pregar o voto nulo ou em candidaturas à esquerda da do PT, me força à cair de boca nele. Curiosamente envolve uma série de autores da editora em que eu trabalho. Aos Favres com os escrúpulos de assessor de imprensa e vamos escrever sobre isso.

Pegue este dois textos publicados no site Carta Maior: SP prioriza o social, escrito por Emir Sader. E esta reportagem de Maurício Hashizume, que fala e coloca trechos do manifesto que pede o voto nulo, assinado por ex-petistas, ainda (acho) petistas, e ex-membros do governo: Desiludidos, intelectuais de esquerda optam por voto nulo. Curioso, né?

A opção pelo voto nulo é válida na vida. Embora discorde, admiro os anarquistas que tem uma visão coerente sobre o assunto, e que foram protestar no centro da cidade. Agora, isso vindo de pessoas que sequer ainda se desfiliaram do PT mostra que a raiva contra a traição do partido à sua origem feita pela cúpula do partido anda cegando. Principalmente quando se lê e se ouve de pessoas que defendem o voto nulo de que Serra e Marta são “iguais”, ou de que ficariam mais felizes com a vitória do primeiro, ou de que o PT é o neoliberalismo mais radical do que o PSDB.

A iniciativa e o manifesto seriam “conscientes”. A arrogância de arvorar-se assim é impressionante. Ele não menciona o segundo turno, nem uma postura em relação ao voto para o legislativo (muitos vão votar em vereadores do PT). Eu, que sempre fui tachado (para tirar sarro da minha cara) de anarquista, vejo me de repente com companhias insuspeitas.

Pior: alguns acenam, que no segundo turno, melhor seria votar em Serra, contra o PT, do que em Marta. Quem defende isso pode ter visto que o PT mudou, mas não notou que o PSDB mudou também, estando hoje muito mais à direita. Não notou à disputa que se dá em São Paulo, ainda que “não substantiva”, para quem tem a vida estável de “classe média crítica”, é revolucionária para quem anda de ônibus, ou tem auxílio de um programa da prefeitura. Que existe mais mecanismos de participação, por mais problemas que eles tenham. Que enfim, existe algo para se defender. Não vêm com quem e com que estão se aliando.

O governo de Marta não é simples, nem perfeito, nem ideal. A Articulação do PT fez de tudo, planejou e atuou para encurralar a esquerda a não ter opção e votar em Marta. Isso é triste? É. Mas deu certo por enquanto e não dá para brincar de mujahadin intelectual, a não se que se queira rifar a realidade, como o PCO que acha que bilhete único é medida contra os trabalhadores, realidade talvez já rifada faz tempo por alguns.

O país precisa de opções políticas de esquerda, para ser oposição e/ou opção ao PT. Mas estas opções têm que ser construídas, não são frutos de factóides. O voto inútil nesta eleição não vai ajudá-las, e votar em Marta não vai atrapalhar este objetivo. Neste momento, eleitoreiro, muito mais útil é reforçar as forças à esquerda dentro do próprio PT.

Ridículo é o tom de platonismo, de “República dos Sábios” que deriva de tudo isso. Mesmo sem concordar com a natureza desta palavra, eu não gosto de atacar o termo “intelectual”, em um país com tanta tradição de desprezo ao conhecimento e ao estudo. Meus problemas políticos com ela poderiam ser confundidos com esta truculência. Mas em momentos como esse fica difícil de não se irritar com a arrogância inerente a esta figura social.

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